sábado, 19 de dezembro de 2009

Geraldo Azevedo / Letras negras

" Pelo jornal o dia chega
Com as letras negras
Do que está por vir
Pelo meu sonho era tudo bem
Você passava e olhava pra mim
Seu olhar miragem
Surgindo na paisagem
De fumaça e luz
No paraíso amor um dia
Imaginamos cidades azuis

Oh meu amor
Meu grande amor
E agora

Serenai! Serenai! Oh verde mar
A madrugada chegou
Começa o dia você me
Incendeia
Amor me incendeia
Até florescer
E nada mais bonito
Que o grito selvagem
Do subúrbio lado blue
Desconstruindo muros
Até o sonho aparecer
Oh meu amor
Meu grande amor
E agora

A voz na sacada
Da casa rosada
A solidão da voz
E na varanda branca
Da alvorada
O tempo cansa
De esperar por nós
Será que é preciso
Imaginar o cosmo
Pra compreender
Que esse neném no colo
Tenta resistir
Essa madona
Quer sobreviver

Oh meu amor
Meu grande amor
E agora

De lá das estrelas
Eles querem ver
Esse mundo explodir
Lágrimas na rua
De verdade
Tudo pode acontecer
Afinal
O sonho é um sinal
Que tenha fruta madura
No quintal do vizinho
Por tanto tempo
Eu fiquei sozinho
Pelo jornal
O mundo acabou
Oh meu amor
Meu grande amor
E agora"

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Sem título

Eu abri minha caixa de mensagens. Não por querer soluções. Não por entender uma lógica nisso tudo. Eu nem sei se por querer. Eu apenas abri minha caixa de mensagens e inverti a ordem.
Fui do fim ao começo. Quando achava que salvar mensagens aprisionaria olhares, maneiras, gestos ou faria disso tudo um pra sempre. Cheguei no momento em que mensagens eram rosa. Rosa e arma. Cheguei no momento do não dito, das represálias, de quando começar um parágrafo exigia cuidado, olhar minucioso. Não podia errar, não poderiam haver mal entendidos, senão todo o encanto se quebraria. Senão não haveriam mais segredos. Senão já não sentiria saudades e minha criação perderia o toque onírico, aquela áurea de fábula.
Ao mesmo tempo, o gostinho de ver o passado por olhares diferentes.Tão distintos, um de cada cor,cada um com sua função. Um deles, contente com o presente, automático, calejado ao dia dia. O outro não só olhava, mas também relembrava. Numa mistura que não haveria outra forma senão jorrar, cair em gotas denunciando meu saudosismo. Resgatando da memória a densidade deste inverter, o quão intenso e amador era tudo aquilo. Nunca mais se teria um outro começo,duvido muito que conseguiria contar de novo tão engenhosa estória.Sabendo que, hoje, ainda sou desacreditado.Desconfiam de minha maior criação.
Pois sim, sempre gostei de tornar pequenas coisas mais interessantes. Florear, recriar, colocar adendos, intenções. Inexistentes, muitas vezes? Sim! Mas é só acalento, não faz mal a ninguém . Apenas ao coração bobo de menino crescendo.
Inverti a ordem de minha caixa de mensagens e revi a criação. Meu maior vivido, minha melhor e pior experiência. Minha rosa e minha arma. Minha obra e suicídio. Uma dualidade que jurava que não teria fim.
Mas não desprezo o gosto da saudade. E derramar de meus olhos bicolores gostinhos de amor jovem, nunca será pecado algum. Apenas mais estórias.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Dança, mago, coração


Exímio feiticeiro:
Girou mundo,
Me fez pião.
O pano de chita na cabeça ,
Colorido coração.

E se por apenas aquele instante,
Se para nunca o sempre,
Ao menos,um traçado de grafite.
Uma nova linha,
Escrita em cheiros
existentes,
amados.
Inteiros.

Assim, uma vez.
De perto,
aquele escrito não seria de grafite.
Mágico, fazia de desenhos,
canções e
de papel branco,
passarinhos coloridos.

De uma dança,
as cores do pano de sua cabeça
Eram epifanias embrulhadas, regalos de alma,
Estava vivo e pulsava,
Eram meus ,
em acordes conhecidos.

Lucas Galati

domingo, 6 de dezembro de 2009

Um pouco de Hilda Hilst

I

"Porque há desejo em mim, é tudo cintilância.
Antes, o cotidiano era um pensar alturas
Buscando Aquele Outro decantado
Surdo à minha humana ladradura.
Visgo e suor, pois nunca se faziam.
Hoje, de carne e osso, laborioso, lascivo
Tomas-me o corpo. E que descanso me dás
Depois das lidas. Sonhei penhascos
Quando havia o jardim aqui ao lado.
Pensei subidas onde não havia rastros.
Extasiada, fodo contigo
Ao invés de ganir diante do Nada.


II

Ver-te. Tocar-te. Que fulgor de máscaras.
Que desenhos e rictus na tua cara
Como os frisos veementes dos tapetes antigos.
Que sombrio te tornas se repito
O sinuoso caminho que persigo: um desejo
Sem dono, um adorar-te vívido mas livre.
E que escura me faço se abocanhas de mim
Palavras e resíduos. Me vêm fomes
Agonias de grandes espessuras, embaçadas luas
Facas, tempestade. Ver-te. Tocar-te.
Cordura.
Crueldade.


III

Colada à tua boca a minha desordem.
O meu vasto querer.
O incompossível se fazendo ordem.
Colada à tua boca, mas descomedida
Árdua
Construtor de ilusões examino-te sôfrega
Como se fosses morrer colado à minha boca.
Como se fosse nascer
E tu fosses o dia magnânimo
Eu te sorvo extremada à luz do amanhecer.



IV

Se eu disser que vi um pássaro
Sobre o teu sexo, deverias crer?
E se não for verdade, em nada mudará o Universo.
Se eu disser que o desejo é Eternidade
Porque o instante arde interminável
Deverias crer? E se não for verdade
Tantos o disseram que talvez possa ser.
No desejo nos vêm sofomanias, adornos
Impudência, pejo. E agora digo que há um pássaro
Voando sobre o Tejo. Por que não posso
Pontilhar de inocência e poesia
Ossos, sangue, carne, o agora
E tudo isso em nós que se fará disforme?

Existe a noite, e existe o breu.
Noite é o velado coração de Deus
Esse que por pudor não mais procuro.
Breu é quando tu te afastas ou dizes
Que viajas, e um sol de gelo
Petrifica-me a cara e desobriga-me
De fidelidade e de conjura. O desejo
Esse da carne, a mim não me faz medo.
Assim como me veio, também não me avassala.
Sabes por quê? Lutei com Aquele.
E dele também não fui lacaia".

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Entre grades

Era ontem ainda. E lá fora chovia. Da minha janela, um cigarro aceso. Meu.

Da janela, viam-se grades. Não só minhas. Grades de minha janela e de outras. Dos tantos.

Grades protegendo e a chuva . Meu cigarro aceso. Protegido da água que caia. Que dançava.

Fumaça também dança. As minhas, numa ciranda entre grades. Tocava a água e desaparecia.

Cinza, translúcida e interna. Num compasso da vontade de um externo instante. Calmaria.

A água tinha passos livres. Gotejava na grade, provocava a fumaça do humano protegido.

Porém do telhado era chuva que caia. Inconstante, acariciava telhas, fazia o ralo cantar.Natural. Inveja aos feitos humanos.

Não haviam regras, o além das grades convencia. Num ritmo que o protegido desconhecia, que a fumaça esquecia a dança e errava os passos.

Desconhecida, uma música que poucos ouviam. Calava o barulho de cidade, apagava o cigarro e desprotegia aquele que olhava entre grades. Que só sabia ser assim.

Aquele que ainda queria aprender a dançar chuva. Ao menos, uma vez.Naquele instante.

Lucas Galati

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Mescla

Nos lençois, aquele cheiro.
Uma voz,
Maçã?
Estranho , odor de estrofe única... seria chuva?

Tecia, roçava, coçava a perna e eu queria dormir.
Aroma ao lado e a cabeça no frenesi daquele entrar de sonhos.
Travesseiro, dos tantos meus cheiros.
Ah! Sim . Esses sim, meus...

Mesclando entre reconhecimentos e o sentir daquele outrem,
Instintos puramente humanos,
Como quando se corta e chupa-se o sangue,
Como uma flor cheirando... intuitivo. Se sabe e só.
Sente, leve ... longe, lenços e lençóis.
Cheiros meus e o gostinho especial de dúvida,
Adentrando mundos,
Fazendo cócegas,
Reinventando,
Sendo feliz com o não sabendo. Vê se pode?
Era fácil a não espera.

Lucas Galati

domingo, 22 de novembro de 2009

Os passionais/ Luiz Tatit



"Já passamos muitas aflições
Também jogamos tudo ou nada
E não foi bom
Já nos despedimos, mas depois
Só sentimos pena de nós dois

Que somos assim sabemos já de cor
Lamentamos muito por não ter
Realizado algo maior
Ou bem melhor

Um volta pro outro quase todo mês
Quê que faz a gente fazer o que fez
Ambos atordoados com a estupidez
Eu você na vida juntos outra vez

Mas
Não dói não
Só vim
Para dar parabéns
Sim!
Parabéns para nós
Os passionais
Parabéns para nós
E aos demais
Que também como nós
Se vão, voltam atrás
Que assim como nós
Não têm paz
Parabéns para nós
Irracionais
Parabéns para nós
Sem rivais
Parabéns para nós
Parceiros infernais"

sábado, 21 de novembro de 2009

Conhecido

Por ontem ,
Remontei aqueles pedaços.
Por horas, as peças não se encaixavam.
Em instantes, aquele desespero comia a carne –
E não se notava .

Desacreditava, pois momentos sempre foram mais coloridos.
O sacrifício de arrancar um sorriso,
Retorcer um abraço,
Beijos e bocas fechadas.
Também não notava.

Uma hora,
Rasgam-se as folhas,
Taca-se tudo pro alto e
O homem inventa as desculpas.
Tenho listado...desculpas pragmáticas.
Vamos logo com isso!

O prazer uno:
Boa sorte, siga em frente...
Já cansei de olhar pra trás e
Sei de cor as cores dessa pintura,
Vermelhas, azuis, roxas.
Mentidas, vividas...
Cores mortas.

Lucas Galati

domingo, 15 de novembro de 2009

Vanessa Love, Lambe, Limbo



Visitavam-na apenas a noite. Quando muito, ela ainda torneava os cílios com um lápis preto dado pelo último namorado, quer dizer, pela última promessa. Quando ela ainda caia nelas, quando ainda acreditava que as fábulas podiam não ter cores, quando achava que a Lua podia ser algo além da iluminação natural de todo dia, além de um raio de sol noturno.
Exaltava os beiços no espelho de bolso e o batom riscava aquele pedaço de carne humana, invertendo a ordem. Sangue por fora, lábio para dentro. Ajeitava os cabelos castanhos tingidos recentemente com uma escova de cabo carcomido. A bota alta preta,micro saia e micro blusa também no estilo vermelho sangue. Sempre gostou de combinar e aquela cor era atrativa aos olhares masculinos. Com passos largos, o branco da Lua refletia na sua roupa, reavivava a feminilidade de todos os dias, mas hoje era diferente, se sentia bonita, mexia os cabelos levemente ondulados e estava feliz. A noite desejava ela e ela não via à hora de se entregar.
Puta! Chega aqui! Flertes, passadas de mal, risadas... Falsas, e o fim sempre aquele: 150 a hora, interessa? Entra no carro, o falo já erguido à sua frente... Sente vontade de ir embora, regado a certa tentação, gostava daquilo e sabia fazer bem. Cede e entre gemidos ecoa seu fingir durante aquela uma hora, segredo da esquina, anos de passos refletidos por Luas.
O dentro por tanto mostrado. O dentro do fora. Não foram picas que algum dia fizeram o coração dela bater mais rápido. Ela tinha uma vida fora aquela do teatro, do vermelho sangue, da rua. Era Vanessa, geminiana, 25 anos de idade, com vontade de prestar uma faculdade, conhecer Barcelona e alguém que a tirasse daquela vida. Enquanto o tempo a desacreditava, escrevia sua estória e guardava na poupança, remontaria o quebra cabeça, daria volta por cima e se mandaria para fora.
Não era um karma aquela vida, gostava do sexo, gostava de se sentir desejada, se protegia todas às vezes e já não bebia há muito tempo. Mas uma hora aquilo tudo cansa.Estar tão próximo do que muitas nunca nem viram, posições mirabolantes, gozos e tantos orgasmos. Músculos, pêlos, virilidade e entrega. Mas nunca um grito de amor, um sentir que a tirasse do teatro, que a fizesse cair do palco. Nunca. Eram cenas repetidas. Duas, três, quatro até oito vezes dependendo da noite. Na sua casa, nos motéis, em Audis, Blazers e Fuscas... Sete da manhã volta e sua casa com o gosto de madrugada ainda, os lençóis revirados, a cama quente da sua última trepada. Cansava. Adentrada, no limbo, lambendo a sua não satisfação e a masturbando diariamente com mais shows, cenas e mentiras. Mas tinha dinheiro na poupança e em outro lugar poderia ser conhecida apenas por Vanessa... Love, lambe, limbo – seu nome da noite cairia, seria esquecido e seu celular desativado. Uma nova vida, um recomeço, mas não ainda... Mais dinheiro, mais Luas, vermelhos, gemidos, novas temporadas de uma peça que parecia não ter mais fim.

Lucas Galati

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Blackout

Era uma noite inteira sem luz e o instante em que mais vida emanou de cada bueiro, beco e esquina da cidade. Uma cidade cantando aos escuros, aquela organização tão estável sendo fragmentada pelo caos. Por horas de um retorno ao passado, uma reação dos instintos, a permissão de ser humano.
Os namorados se entregando ao preto e cinza - já não se viam. Os desconhecidos trombando com as não faces. E riam. Os dançarinos das ruas entre seus diários passos bêbados encostavam e não ouviam xingos. Entrariam, agora, nos ônibus.
Os carros seguindo o ritmo dos passantes. Auto organização instintiva, o homem se permitiu ser animal por àquelas horas. Se deliciou ouvindo boa música aos olhos fechados. Teve aqueles que até deixaram uma lágrima cair. Ninguém veria.
Ficaram nus, se reuniram a família, deram abraços e riram um pouco mais. Era um país inteiro sem luz. Um país de Saramago... Estagnado, dos homens sem papéis. Deixaram seus cargos e foram as ruas tomar cervejas quentes, andaram descalços em plena Avenida Paulista. Acenaram pra Lua, alguns viram o coelho estampado no branco. Mandaram mensagens dizendo: “Queria estar ao seu lado”. Sentiram o lúdico tomando conta e subiram no sofá com as crianças, amanhã poderiam dar alguma desculpa no trabalho. Dormiram mais tarde, ou mais cedo.Foram, ao menos , horas diferentes...
Toda semana deveria existir um dia em que apagassem todas as luzes da cidade.

Lucas Galati

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Quando se diz,
Finda.
A mais pura ignorância , quem sabe...
Por muito acreditei no gesticular de mãos,
Hoje, fico mais com o beijo da mulher de uma vida toda,
Com os fogos em véspera de Ano Novo,
Com os peixes na beira do mar.

Dizendo se pinta,
Um quadro, aquela metade.
Aquarela e o seu lápis de olho,
As mãos de céu,
Pincelar de nuvens.
Seu olho azul mergulhando
Na palidez de minha íris...
Uma canção me escolhendo,
Uma vez, enfim.

Aos riscos , me completo.
Paradoxal,
Verborrágico e amante.
Amante do dramático,
Guerrilheiro do tempo,
Vazio no dentro.
Hoje, redescobrindo em seus azuis,
No olho de festa,
No jeito faceiro,
Um sentido mais sólido de vida.

Lucas Galati

sábado, 7 de novembro de 2009

Tarde quente

Um caminho limpo , de terra batida e árvores dos muitos sabores. Caminho livre, dos carros inexistindo, dos pássaros de Mia Couto trazendo o lusco fusco em uma caixinha dada a mim. Presente de despedida.
Uma tarde minha e do meu caminhar finalmente permitido. Passos que não traziam mais lágrimas, a poeira não vinha das pedras que antes caiam, não havia mais asfalto machucado nessa estória. A poeira, por fim, era baixa. Vinda do meu silêncio, do não saber mais questionado e mais exposto. Aquelas indagações de conseqüências mutáveis, transfigurando-se em cortes, em sangue. Por vezes, água e sorrisos. Mas de final sempre vermelho e gotinhas pulando em azul para fora do olho.
O meu não sei do final sabido. O duvidar daqueles que dentro carregam seguros passos e entendimentos, e que numa tarde, resolvem sair para levantar poeira e ver pássaros. O livro tinha acabado, estava quente lá fora e por alguns anos deixara de beijar o vento. O instante fez-se agora, em um não sei sabido.

Lucas Galati

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Querer

Não pedia muito. Queria por um dia, uma hora, talvez até meia, poder ser arrogante como alguém muito bonito, ter o nariz empinado dos atores, queria passar e ver que alguém me olhava, queria que me pegassem pelos braços e sem perguntar ganhasse um beijo, queria passar na rua e conhecer um desconhecido, ou talvez, ser conhecido por alguém desconhecido. Um texto só para mim, queria uma declaração anônima, mas sem flores ou carros espirrando papel prata. Por um dia gostaria de ter o passado, mas não ele todo, em momentos. Fragmentos saudosistas, um drible na realidade. Queria pensar a mesma coisa que alguém, queria um sonho comigo, queria um sexo recíproco e intenso, queria a Lua mais perto, poder viajar a hora que quisesse. Queria não ter compromissos, viver ao acaso, queria sair do cinema de mãos dadas, queria uma relação de anos, da mesma forma, um encontro único de um dia.Gozo imediato. Um trabalho reconhecido, dinheiro de forma prazerosa, queria não me irritar com o fora, queria poder acalmar o dentro. Queria um mergulho de cachoeira e depois sentir o vento no cabelo, um secador natural. Queria ser sincero, e as vezes, mais mentiroso. Queria um lugar inóspito com alguém querido, queria goles de segurança, certezas em terrenos movediços, queria vontades ditas, desejos saciados e mais sonhos, queria conhecer outros quereres, uma vez ter de me adaptar com o diferente, com outro corpo. De alguém que valesse a pena. Queria...

Lucas Galati

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Meus textos por outros lugares,
agora, se vão.
Calados,
em goles,
secretos
eu me faço inteiro.

Nesse labirinto dos tantos,
encontrei acalento e repouso,
um refúgio...
dali diz-se tudo e
já não sinto o não permitido.

Lucas Galati

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

E a cada dia, do todo instante, do não tido, do intacto ao palpável, do insoso,do temerário, do duvidoso, daquele esperar inquieto...chegava-se a mesma conclusão: o cansar da espécie humana. Cansaço...

Lucas Galati

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Dona Cila/ Maria Gadú

"De todo o amor que eu tenho
Metade foi tu que me deu
Salvando minh`alma da vida
Sorrindo e fazendo o meu eu

Se queres partir ir embora
Me olha da onde estiver
Que eu vou te mostrar que eu to pronta
Me colha madura do pé

Salve, salve essa nega
Que axé ela tem
Te carrego no colo e te dou minha mão
Minha vida depende só do teu encanto
Cila pode ir tranquila
Teu rebanho tá pronto


Teu olho que brilha e não para
Tuas mãos de fazer tudo e até
A vida que chamo de minha
Neguinha, te encontro na fé

Me mostre um caminho agora
Um jeito de estar sem você
O apego não quer ir embora
Diaxo, ele tem que querer

Ó meu pai do céu, limpe tudo aí
Vai chegar a rainha
Precisando dormir
Quando ela chegar
Tu me faça um favor
Dê um banto a ela, que ela me benze aonde eu for

O fardo pesado que levas
Desagua na força que tens
Teu lar é no reino divino
Limpinho cheirando alecrim"

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Dia Branco/ Geraldo Azevedo

"Se você vier
Pro que der e vier
Comigo...

Eu lhe prometo o sol
Se hoje o sol sair
Ou a chuva...

Se a chuva cair
Se você vier
Até onde a gente chegar
Numa praça
Na beira do mar
Num pedaço de qualquer lugar...

Nesse dia branco
Se branco ele for
Esse tanto
Esse canto de amor
Oh! oh! oh...

Se você quiser e vier
Pro que der e vier
Comigo

Se você vier
Pro que der e vier
Comigo...

Eu lhe prometo o sol
Se hoje o sol sair
Ou a chuva...
Se a chuva cair

Se você vier
Até onde a gente chegar
Numa praça
Na beira do mar
Num pedaço de qualquer lugar...

E nesse dia branco
Se branco ele for
Esse canto
Esse tão grande amor
Grande amor...

Se você quiser e vier
Pro que der e vier
Comigo

Comigo, comigo."

domingo, 25 de outubro de 2009



Guardei água de rio em uma garrafinha. Em segredo. Passavam os dias e eu ia tomando. Cada dia algumas gotinhas a mais. Pois te digo, aqui dentro está estranho. Tô tão grande. O rio levou os pensares constates, curou a ferida da alma e clareou um caminho. Me sinto enorme. Sossego vem em água de rio?

Mais um final de livro.

Tinha filhos, era casada, o ambiente em casa bastante harmônico, ao ponto de dar inveja a alguns membros da família e nunca ter precisado acender incenso. Trabalhava e no seu ramo, era bem sucedida. Como passatempo sempre teve seus livros. Uma biblioteca diversificada e uma gama de citações anotadas num caderninho guardado no criado-mudo.
Dizia sempre que os livros davam a chance de se pensar de outra forma, ser mais dura frente as adversidades, sentir-se mulher, ter orgulho do todo construído. Gostava de rever as ações tomadas, refletir. Adorava desafios. E este ela já esperava. Repetia-se sempre, tinha se habituado a essa barreira - o livro da vez estava próximo ao final.
O coração a boca esperando a última página, as linhas já passavam mais rápidas, despercebia os detalhes, queria terminar, uma conclusão naquilo que há semanas vinha se entretendo. As mãos tremiam, as unhas eram arrancadas em sintonia ao terminar de cada parágrafo.
Fim, pronto. Sabia o final da estória, um bom livro, podia agora descansar e dormir até mais um dia de trabalho, mais tarefas, poder usar o blazer novo que comprara em promoção, ver seu computador, tomar o café na padaria, o mesmo ônibus, o trânsito que no dia seguinte enfrentaria.
Fecha os olhos, o coração era sentido na boca, nos dedos das mãos, nos braços. As batidas a atrapalhavam e confundiam seus pensamentos. Começava a suar, mexia seus pés em movimento constante, algo a incomodava. A gola do pijama? Tinha feito xixi antes de dormir? O ronco do seu marido? Nada disso acontecia. Por que tanto movimento? Chega, não quero mais, posso descer?
Tudo de novo, era o final de um livro.
Pensava na sua vida. Nos amores antigos, na vida de colégio, a entrada da faculdade. A primeira gravidez, a segunda. O primeiro sexo sem camisinha. A formatura. Seu primeiro beijo. O casamento. Cada pedaçinho da sua vida ligava-se ao fechar de um livro. Mais suor... Tinham sido tantos, tantos enredos, tantas outras estórias. Diferentes, por vezes, mas conexas ao mesmo tempo. Travestia-se num personagem em algum dia, já duvidara de si mesma em outro, já se perdera tantas vezes dentro de si - levanta e troca de pijama.
Uma vida sempre muito certa. Regrada, com um começo clássico e um término previsível, ao estilo americano. Piegas, talvez. Nunca havia se questionado se era, de fato, feliz. Ou o que seria isso? Não invejava ninguém, não queria ser diferente. Por outro lado, por que os tantos livros, aquela vasta biblioteca? Cultura? Não era. Todo final de livro era sempre a mesma sensação. Sempre uma noite mal dormida.
Via nos livros um pouquinho do que ela nunca teve. Do que não sabia. Tinha medo de se desconhecer, queria ações precisas, ao tempo certo e com sorriso no rosto. Não podia ter um dia ruim. Estava viva. Uma vida perfeita, filhos saudáveis e um marido decente. Não tinha problemas e se tinha via soluções pragmáticas.
Os livros, porém, davam seus problemas, abriam feridas, curavam outras. Os livros a questionavam, inquietavam suas noites. Pois então, por que lia? Seria ela uma contraventora? Uma subversiva. Queria ela ir contra corrente? Contra a idéia de perfeição? Talvez, uma sádica? Louca por autoflagelação e masoquismo. Não lia por cultura e sabia disso. Não sabia quando esse hábito tinha se iniciado, mas agora, já era tarde para pensar nisso. O relógio marcava três e meia da manhã e mais um dia estava por vir. Ônibus, café, passos, teclas, sorrisos...
Não conseguia dormir. Ela tinha desenhado sua estória, porém seria esta a vida que queria? Seria mais feliz de outra forma? O que era ser feliz? Quem ela era? Suor e o lençol já saindo da cama por tantas viradas de corpo.


Naquela noite, ela não dormiu. Acordou e foi direto ao seu trabalho. Fez as mesmas tarefas, cansada, perturbada e com o coração a boca. Tomou seu café no mesmo lugar, digitou as mesmas teclas, conversou com as mesmas pessoas e com seu marido da mesma forma, deu um beijo de boa noite em seus filhos e quando deitou em sua cama, abriu um novo livro.

Lucas Galati.

sábado, 24 de outubro de 2009

Razões

E as palavras seguindo sempre aqueles dois caminhos: a dificuldade em dizer e a facilidade de não ser entendido. Tudo o que aqui escrevo são reflexos de instantes, são respostas sucintas de uma vida sendo descoberta. Não busco verdades, nunca tive pretensão de me fazer entender, de ouvir que o mesmo ocorria com outrem.
Todos os textos são espelhos de uma mutação humana. Inconstante, brinco nas afirmações, nego o antes certo, confundo o errado, crio sentidos, inverto a ordem. Não sou um, sou os tantos, às vezes, os poucos que faz do passar dos dias algo a ser pensado, discutido e valorizado.
Descobri um dos maiores prazeres com o “emgoles ácidos”, entendi o que era a escrita pra mim e quão bem ela me fazia. Uma forma de tratamento pessoal, de reavaliar decisões tomadas, uma autocrítica constante, uma forma de descobrimento paulatino e gustativo.
Jamais desconfiei o poder das palavras, jamais pensei que outros poderiam se reconhecer em meus escritos. Por outro lado, também não imaginava que um blog poderia ser a forma perfeita de acariciar o ego de alguns, de irritar outros, de perpetuar algo não querido, de afunilar até não se ver outras saídas, outros temas, outras escritas.
Eu entreguei meu ácido a muitos, porém acabei sendo definhado por ele. Acabei acreditando numa vida de duas portas, endossando minhas repetições, anulando outros caminhos. Reafirmei demais um inexistente corrosivo e me perdi dentro de acentos , formalidades e metáforas.
Não penso mudanças, apenas se meus textos são instantes e pensamentos tão pessoais, prefiro deixar marcado um questionamento por muito evitado. Engoli meu ácido e me portei acreditando em apenas duas saídas, quando na realidade, a vida chacoalhava e cuspia a diversidade em minha cara. Não posso e não quero mudar o que aqui escrevo, mas de fato, é de suma importância anunciar o cansaço. Um corpo fervendo em angústia,perdido em unhas roídas e cacoetes. Cansado e absorto em meio ao ácido de meus goles.

Lucas Galati

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Desconhecido conhecer

Reconhecido está,
De um jeito desconhecido
Do aquilo
Que sempre se achava,
Mas nunca se era.

Teatro e aplausos,
Mágico de facetas e o às de copas
Em punho.
Apresentação de circo com
O de dentro.
Baderna, murmúrio...
Desapego em dança.

Aquela não era a pessoa que
, um dia,
Olhos viram,
Refletiram – credo,
Afeto.
Olhos fechados em amor.

Fins de semana virão,
Anos passarão,
Dias , horas
E aqueles minutos de sangue.
Mar e lua, conexos naquele instante,
Um refletindo o outro e a
Intensa vontade do não esquecer.
O lembrar daquela primeira pessoa,
Que hoje some.
Também em dias, em horas,
Em braços de outros.

Vulto, cócegas, vago.
Em pó de borracha, permaneço.
Já não se faz idéia o quão fundo a marca fica,
Em silêncio,
escondida nos sorrisos e no reverter
daqueles sonhos.

A marca és segredo,
Sangra em angústia,
Reluzindo as maiores fraquezas e inseguranças.

Ao fim, certo algo fica.
Não era aquela pessoa que havia marcado,
Se sonhado,
Traduzido ou lacrimejado.
Um alguém desconhecia,
Disforme,
Perdido. Vão...
Em inconstância e pequenas doses de felicidade.
Pois assim seja,
Passo à metáfora,
Ao não dito,
Ao evitado.
Passo a esquecer,
Sou esquecido,
Na mais forte memória:
O não dito,
Aquele sempre calado.

Feliz seja,
Em seus toques pelo mundo,
Sem nunca ter provado gosto de terra,
Carinho de rio,
Ou marola de mar.
Sem nunca,
Em não toques,
Evita-se,
Um brinde à ti,
para sempre.

Lucas Galati

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

A noite desce/ Fernando Pessoa


"A noite desce, o calor soçobra um pouco,
Estou lúcido como se nunca tivesse pensado
E tivesse raiz, ligação direta com a terra
Não esta espécie de ligação de sentido secundário observado à noite.
À noite quando me separo das cousas,
E m'aproximo das estrelas ou constelações distantes —
Erro: porque o distante não é o próximo,
E aproximá-lo é enganar-me."

Passos despercebidos

Lajota fria e passos.
Um homem ao chão,
Passos frios e
humanos.

O homem e o chão,
Frieza em passos,
Lajotas humanas.

Homem-chão,
Caía,
Aos passos,
Despercebido às lajotas –
Humanas.

Chão humano,
Feito de homem,
Feito os passantes,
Imóvel como a fria lajota
Daquela rua paulistana.

Lucas Galati.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Novas músicas

E eram repetições não intencionais,
o pensar embriagado:
Será que ainda se deixa as gotas de vodca amanhecida
pela realidade de um capítulo lido?

Irreal premissa,
desfigurando entre avessos e
toques da maneira mais simples.
O não permitido, mas desejado,
dentro da cabeça
titubeando variáveis conformistas.

Porém, a música aumentou,
a dança tinha ganhado novas cores,
um ritmo desconhecido,
ludibriante. Quem sabe,
inexistente.

Gritar aos ventos:
Não pense! Entre nessa roda,
pintemos outras cores dessa estória em preto e branco.
Cópias cada vez mais sincrônicas de realidade minha.
Transviada ou errônea?
Acalentava. De fato, acalentava e
dava vontade de cantar.
Mais uma vez até o não saber,
até o sol raiar.



Lucas Galati

domingo, 18 de outubro de 2009

Sem título

Não.
não seria.
O fato.
De fato.

As cores
e a luz por outros lados,
Recaia em doses esparsas
a face tombada.

Evitar, por fim, seria.
Adiar... melhor assim.
Deixar pra dentro da cabeça,
até ela gritar de novo.
Em breve,
amanhã,
até o dia em que entenda a razão disso tudo
e se possa dormir.

Lucas Galati

Cume



E cada vez mais, quero dizer o quanto quero.
O por quanto errado, mas desejável. Apenas.
O nunca é deixado de lado,
lugar tem-se, agora, aquela uma vez.
Uma vez de intenções explicitamente diferentes,
opostas. Antagônicas.
Mas,uma vez existente. Após todo aquele tempo, uma estória. Una.
Desenhos diferentes, momento qualquer - cócegas a ti. Junto ao instante, especial - as fotos.
Sim , as fotos!

Dito se está -
inanição induzida,
desejos em altas doses,
embriaguez e críticas
e toda aquela ansiedade.
Crises, o toque martelado na cabeça. Mais críticas.

E não sairia. Bastava, agora, silêncio. Pois era tudo
velado, era engessado. Tudo imutável.
Já não seria o da foto e sabia. Seria eu sempre o porta retrato,
sustentando frustrações e os tantos outros instantes.
E não sendo , por fim e enfim, viu-se o tudo refletido numa imagem dentro do que jamais deixara de ser...
aquele porta retrato em cima da estante

Lucas Galati

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Não há título que explique...

Hoje, foi além de tudo o que eu mais esperava. Foi melhor, veio sentido nas veias, no palpitar sentido em ponta de dedos, no toque, na fala retorcida. Foi daquelas definições que chegam bem próximo ao perfeito. Ao perfeito, hoje, palpável. À mim.
Suas palavras sincronizavam junto a um olhar jamais visto. Minha verdade desnudando em frente a fumaças de cigarros. Minhas e suas. Numa simplicidade e recolhimento que não sabia existir.
Trouxe-me acalento em doses de água de mar, de frasquinho de cor transparente. Trouxe sossego e ajuda a um alguém que tanto necessitava. Ser ouvido, melhor, ser entendido.
Tarefas ardilosas a dualidade de (des)conhecer. Porém, para mim cada letra têm força, encravando em frases e acentos que penetram e , de fato, marcam. Não sabia.
Marcam como facas, como livros, lágrimas. Expus a ti todo meu passado não vivido, toda minha ânsia de mudar, esquecer, transformar, finalmente ponto em sinal de fim.
E só contigo, recolhido em seus braços pude ter certeza que conseguiria. Tinha já trilhado caminhos, mas acreditei poder ,mais uma vez, fazer de tudo pó de borracha e reconstruir mais um erro.
Mais um ? Dessa vez não. Faz-me mal, dessa droga fiz meu fim e tracei começos importantes. Sem a droga, agora, trilho minha vida. Rasgo em grito a dor de vício, porém ao seu lado e para sempre.
Vendo-me antes de tudo.E de qualquer outro. Acreditando em algo que já denegria.rascunhava.
Enegrecia.
Em mim.À mim. Junto a ti. Assim pra sempre!
Obrigado , muito obrigado...

Lucas Galati

Desejo amanhecido

Era uma rosa, um pedaço de um pipa, ou talvez, uma carta. Era quadrado de bordas corroídas, há muito guardado ali estava.
Já não sabia desde quando não fitava. Dentro da cabeça, a memória e a certeza da forma.Pensado tinha se tanto, que o novo parecia inexistir.
De dentro, o caderno ressecava aquele pedaço. Agora, já amarelo. Memórias esquecidas, esfriadas, cor de antigo. De um passado tido importante. Descabido. Transviado e , de fato, existente.
Se a rosa, chega-se perto e cheira. Se o pedaço de pipa, acaricia lembrando a textura do tecido. Se uma carta, lê-se as palavras inscritas em grafite já bastante apagado.
E então, da rosa vê-se o sangue , sobrara um espinho.
Do pedaço de pipa, o doído levar do vento, baforada levando longe aquilo que permanecia: chão, pedra e folhas de papel chorado.
Das cartas, os escritos mais internos, de um eu , na época, tão desconhecido. As palavras intragáveis da situação que não se fazia.
Ao fechar o caderno, onde dentro , talvez, a pipa, quem sabe a carta, ou mesmo a rosa... via-se que sempre um adendo existia. Sempre um detalhe que culminava em sangue. Dentro ou fora, vermelho ou pulsante. De uma estória repetida, inventada, recontada.
De um conto inexistente, de adendos, pudores e enfins.
Nada havia mudado.
O caderno volta pro mesmo lugar, as memórias aquecidas e uma lágrima rasgando a face já bastante enrijecida do alguém que nunca chegou perto do desejo amanhecido. Do pensar permanente. De pétalas, sangue, farpas e escritos. Seus e sóis. Abrindo caminho para romances futuristas e contos de fadas.

Lucas Galati

sábado, 10 de outubro de 2009

O Prédio, O Tédio e o Menino Cego/ Santiago Nazarian/ página 55

" Ninguém controlava. Lá embaixo o mar se agitava e chegava até lá em cima... seu som e seu cheiro, pizzas amanhecidas, anoitecidas. Alguém notava? Provavelmente não , porque eram meninos que moravam na Praia. O cheiro já fazia parte. Mas o Mestiço provavelmente sim, porque era isso que ele mais sentia, lá de cima: o cheiro de mar, lá embaixo, indicando a que altitude estavam. Não era só a música do mar que ouvia, era a música da música. Diversão.Maçãs do amor e paqueras noturnas, em doses diminutas, verdade, porque aquela noite ainda não era temporada. Não eram férias, nem final de semana, para os outros que não passavam por greves escolares. Então a diversão que ocorria era só entre gente desocupada, ou gente descompromissada, ou gente muito perdida, ou muito desajustada aos climas e às estações. Mas afinal, é de se esperar que qualquer um dentro de um livro seja, por que as estações passam e os personagens ficam como flores secas, distantes de suas verdadeiras naturezas, que já fluíram, já esvaíram, já se foram com seus leitores. E por isso suas histórias são mais interessantes, são mais diferentes, mais inusitadas. A história dos loucos só pode ser lida pelos sãos."

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

A espera de um fim

Esperando olhar e se ser.
Cercear um momento,
fazer dele mais segundos,
minutos,
tempos ou novas fases.

Pisar ao chão gelado,
encontrar os pés,
sentir os corpos protegidos em lençois,
em avessos tão similares,
meu sexo e teu hálito.

Dar a mão em vertical,
inesperado impulso
e feito naquele mesmo instante podado.

União de estórias,
de outros instantes
cuspindo novas linhas,
apagando refluxos,
invertendo arestas,
achando outras vértices
do sem final.

Quero um andar seguro,
olhar de que agora se pode,
se deve e se faz.
Incerta certeza, porém galgada.
De fato , enfim.
Olhar de espera,
ansiando o sem fim.

Lucas G.

domingo, 4 de outubro de 2009

Os dígitos/ Kléber Albuquerque

"Os dígitos vermelhos do rádio-relógio
Ainda marcam a hora exata em que você saiu da minnha vida
A chuva fria, o automóvel, o olhar de falsa loura
O adeus como um bombom de goma arábica na boca

Ter de sair assim do seu caminho
Ter de agora virar "amiguinho"
Você não sabe eu estou tão sozinho

Os olhos vermelhos de assistir TV
Na madrugada em que você saiu da minha vida
O vídeo, o telefone, o faz, o diempax, a pizza gelada
A janela escancarada respingando céu na roupa
Olhando asfalto como se fosse praia
Conversando com as samambaias
(elas entendem os de minha laia)

Ter de sair assim do seu caminho
Ter de agora virar "amiguinho"
Você não sabe eu estou tão sozinho

Tudo ficou tão quieto
Os gatos do vizinho, as goteiras do teto
Tudo ficou tão chato
Que eu já não sei, que eu já não sei
Tudo ficou tão chato
Banho de porta aberta, deitar na cama de sapatos
Tudo ficou tão quieto, tudo ficou tão quieto
Tudo ficou tão chato

O mundo agora está tão absurdo
Desabafei com um criado-mudo
(ele concorda comigo em quase tudo)

Ter de sair assim do seu caminho
Ter de agora virar "amiguinho"
Você não sabe eu estou tão sozinho

Tudo ficou tão quieto
Os gatos do vizinho, as goteiras do teto
Tudo ficou tão chato
Que eu já não sei, que eu já não sei
Tudo ficou tão chato
Banho de porta aberta, deitar na cama de sapatos
Tudo ficou tão quieto, tudo ficou tão quieto
Tudo ficou tão chato"

domingo, 27 de setembro de 2009

Não satisfeito com o uso abusivo de tantas mentiras, de um discurso mergulhado em vão e frieza. Vai-se além , mostra-se, agora, fraco e vira as costas. Pede-se para esquecer de tudo. Acomoda-se em tão trivial postura.

Pedido concedido, promessa feita. Mais um rascunho de grafite, onde só contorno se faz a figura. Jovem e incompleto. Rascunho.

Um dia sentirá falta das cores, só espero já ter nas mãos um quadro pronto.

Lucas Galati.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

O não silêncio

O cigarro aceso no escuro. A janela aberta e a fumaça levando o vento. Um rangido de cidade, um barulho de porta abrindo. Um bocejo, uma gota de água na pia.
Barulho repentino ensurdece o não silêncio. Janela fechando. O não silêncio perdido. O repente som enegreceu a percepção dos assovios da noite. Calou os pensamentos de janela.
Sabido estava, que a janela fechada minha não era. Alguma outra, de um outro alguém, se fechando em meio a noite. Silenciando o meu não silêncio, rasgando as notas mínimas ouvidas ao alguém, antes, tão atento.Um outrem calava a minha noite.
Uma tragada longa. Um susto perfazendo-se em gotas, desnudando aquele momento em um eu ressabiado. Circundava o ambiente, olhava o fora e algo procurava. O alguém, o barulho ou a janela.
Ninguém. O não silêncio retorna, ouvem-se novamente as gotas da pia, as notas da metrópole. Porém, alguém. Sabia de fato. Alguém ali tinha o visto. A janela já não era mais sua, aquele não silêncio já não era seu. Joga o cigarro na privada. Alguém. Alguém tinha o visto. Alguém fantasiado de ninguém. De som. Da janela. Calando e sumindo. Em meio à noite, de dentro da metrópole. Do seu som. De dentro daquele não silêncio. Antes, seu. Agora, de ninguém.

Lucas Galati

domingo, 20 de setembro de 2009

A sádica ingenuidade entre ler e aplicar. Correnteza que leva, marola regurgitando onda grande. Bate em pedra e estilhaça em menores pedaçinhos. Talvez, só assim vire areia. De tamanho grão.


E uma distinção passe a existir.

sábado, 19 de setembro de 2009

Como a tora, como fogo e cinzas.

De promessa feita, tiro as claves desta canção. Como aquela semana de insônia, como a face de mesmas vezes, como aquele resto de fogueira, que depois de tamanha labareda ficam toras. Vermelhas, pulsando em agonia. Saudosista madeira, lágrimas de luz; de fogo, queimando por tudo aquilo que já foram. Tora chora fogo. De tal maneira, que difícil fica definir se ali em meio a tanta luz existe ainda a primeira tora ou se tudo já não se passa de lágrimas. Lágrimas de fogo. Lágrimas em fogo. Em tora.
Mas a madeira vê-se a si e só. Queima por razão natural. Estopim de forma retesada, de vida contada, porém de um estória que vai além. Além daquele pedaço ainda frio. A tora emana de si os maiores contos do mundo, expelidos pela labareda, chorados em rodas, em amarelos, azuis e vermelhos. Chorados em fogo.
De promessa feita, queimada está a última estória. O fogo foi tão grande, iluminou, esbravejou , mas, hoje,em cinzas. De promessa feita, cinzas não mais ocultas. A tora, hoje, lembrança. O fogo, as maiores sentimentalidades. Queimaduras pelo excesso de palavras, de um contingente de detalhes inoportunos. Daquela impossibilidade cega e verossímil. A tora apagou em lágrimas. O fogo escorreu de dentro e rachou-se em cinzas.
De promessa feita, emancipação. Fogo lacrado, estórias, contos escritos no caderno velho. Da saudade e das gostosas lembranças de um futuro de outras toras, fogos e cinzas. Porém , outras. Aquela fogueira há muito apagada estava, apenas eu não via.

Lucas Galati

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Dela para ela

- Da sua boca, carne puramente desejada. O que havia de promíscuo em dois lábios se tocando?
- Mas não, assim não seria. Jamais, feia da forma que o espelho gritava. Os óculos, as espinhas, esse jeito torto, parecendo toda vez estar com cólica.
- A pele clara, as unhas intactas, as mãos torneadas culminando em veias tão bem limitadas, carne viva. Movimento perfeito.
- Pois disso já se sabia. O mundo endossava. Porém, as tantas críticas. Pense, pense... Os defeitos. Os erros – as unhas na boca e o pé em repetições aflitivas. A classe toda a notava.
- Pequenas, pequenas nesse mar que carrega aí dentro. És pequena apenas no tamanho, guarda rios de cores e sabores. Desejo, hoje, é segundo nome. Dentro de ti. Você inunda sentimento. Pois diga.
-Já disse! Em nada adiantou.
- Quem sabe outra vez?
- Louco só pode estar! Não sou dessas, tenho respeito a mim mesmo.
- Tens orgulho!
-E se for?
- Engula. E o diga. Ande!
- Não adianta, gostar é injusto. A estória se formou em via única. E assim seria! Foi dito. Acostumei-me.
- Assim vejo! Pois as máquinas deste século de fato dizem?
- Claro que sim! De uma forma fácil, sem contato... Não se vê!
- Dizem tão fácil quanto mentem.
- Nada se aplica neste caso. Sinceridade em busca de amizade. Forte demais, entende? Não transforma.

A luz do sol entra pela janela e bate exatamente no olho. Olho dele. Azul que reflete vermelho dentro dela e relembra aquele sonho. Queima e fogo. Afoga em angústia. Ela muda de posição, bebe um gole da água da garrafa em sua mala e tenta se concentrar no que o professor dizia.

- O cabelo liso, o acostumado não toque. Nunca havia o abraçado. Imaginava como seria. Tocar em seus braços, beijar a ponta do nariz menino. Olhar no fundo daquele mar em forma de olho. Se perder em tais águas.
- Pois aqui te conto um segredo. Dentro de mim jaz algo que ninguém pode tirar. Sonhos. Sempre tão bons e completos e tão meus. Acontecendo em minutos, mas em ritmo conhecido. Acalenta.
- Dentro de você?
- Desculpe-me , dentro de nós!
- Melhor assim. Porém, pretende viver de sonhos agora?
- Viver é tão amplo. Se em sonhos me completo. Deixo a realidade sem compreensão.
- Pisará em nuvens daqui pra frente. E o calor, seu fogo? Esse vermelho quando irá sair de você?
- O vermelho sai apenas pra mim. Quando fecho os olhos e resgato o mais querido , aquele desejo do meu entender. No toque suave, no preenchimento onírico, do calor de mim de dentro para eu mesma aqui fora. Curativo aos solavancos de uma vida de poucas falas. Porém, vida cheia de pensar. Eles, hoje , são parte de mim e os aceito como existência.
- Deveria tentar dizer isso algum dia.
- Não penso em algum dia. Se ainda não pude, me apaixono pelas situações que aqui dentro planejo - toca em sua cabeça e nota que a classe inteira vira o gesto e a fingi coçar, mas continua - Amar de forma intensa. Ser intensa e saber esperar. Não esperar concretude, esperar que um alguém apareça e que minhas posturas possam ser outras, ou talvez, as mesmas. Mas sempre densas a mim. Sentir o vermelho pulsando. Meu vermelho.

Aquela outra voz, aquela voz dela que se tanto perguntava, por fim, cala-se . Ela havia se convencido de que o amor não precisa de reciprocidade. Talvez, não o amor em si, mas o amor dela. A sua forma de amar e de se sentir sua, completa, vermelha. Uma discussão de uma aula. Dela para ela mesma. Dois pontos eqüidistantes, moral e desejos. Engolfados num dentro tão dela. Num amor que apenas ela entendia e esperava. Esperava mais sonhos, mais calores e vermelhos de outros tons.

O sinal toca. Assustada, mexe as mãos buscando reavivar a circulação interrompida por horas de apoio de cabeça, dá um gole de água. E diz baixo, a si mesma:
- E se, acerca de tudo, ele não vier. Tudo bem será apenas mais um dia. A noite o roubo ...

Lucas Galati

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Irremediável insanidade

E visto errado
Por mais que fosse,
A cansada estada
Numa roda maior.
Um maior estranho.

Laços tão seus,
Tão leves, mas soltos.
Laços de constância,
Pouca balburdia.
Laços retilíneos,
Cooptando certezas
E feliz em estar.
Era parte.

Porém, o avesso em si se mostra.
A loucura desenfreia,
Uma presença angustia,
Vê-se inimigo.
Aquele mesmo lutado pelo perto,
Por contato,
Pelo choque,
Ou por um beijo.

O que ocorria com a sanidade?
Passa , hoje, léguas do antigo ponto de partida.
Vociferava acidez,
Trança as pernas e apaga velas.
Desacredita.

E desse nó de peito,
O desespero angustia
Em novela,
Romance de capa dura,
O cortejo estranho ao novo contato
Na cabeça.

Mãos dadas,
Coração a boca.
Vontade de gritar, sem poder
Sem saber.

Só não queria,
Não podia,
Discordava em caras.
E, assim, apagaria fogo
Em boca,
E silenciaria.

Traga,
Retorce,
Afunda.
Aprenderia , por fim, lidar com
o aquilo.
O aquilo mais querido,
Cantaria em alusão ao fim da posse.
Ganharia controle,
Leria um livro,
Daria um abraço e
Pediria desculpas em sinal de fraqueza.
Corrompendo-se ao histórico,
Desnudando em soluços,
Num ciclo nocivo de
Querer e poder,
De amor e ódio.
Num ciclo fatídico
E oposto.
Assim seria.

Lucas Galati

domingo, 13 de setembro de 2009

Entre alcoolicos cigarros e grades em dia de chuva

E exemplos já não faltam frente aquilo que não se quer. São os beijos, são sorrisos, mãos e dentes a mostra. Um arrepio na espinha – não se podia assim ser.

Uma felicidade regada a álcool da pior espécie, veias drenando matéria morta. Purulenta. Organismo cuspindo altas doses de líquido e só. Já não se cuida, não importa. Não se podia dizer feliz. Desaprendido estava.

Traça roendo livros, os tantos na estante. Nem literatura, cinema, artes. Seu corpo estava salobro, sua mente afogada em descrença.

No fim da tarde, o cigarro entre as grades do banheiro. Em frente, a cidade em dia de chuva. O barulho de água e seu líquido caindo em cinzas, em lágrimas. Não era a falta de palavras, essas sempre em riste. Agora, porém, até elas enfadonhas estavam. Eram redundantes. Mesmice de final sabido.

E tudo sempre acabava nos cigarros, em grades e altas doses de água, resquício de noite anterior.

Na mente, as vagas lembranças de felicidade drogada. De sorrisos esquecidos. De uma raiva latente e indesejada. Mais cigarros e aquela água encarcerada em corpo e caindo lá fora.

Cospe, olha-se no espelho para assegurar se ali ainda estava e vai dormir.

Na privada, boiava líquido de dentro. Lá fora, ainda chovia.

Lucas G.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Na ordem inversa?



A escada que cansava pelos imensos degraus, daqueles que se abrem bem as pernas, apóia as duas mãos no joelho, conta um , dois e vai.A folha de jornal dobrada em formato de barquinho. Perfeito chapéu.
As tentativas frustradas de se colocar os pés nos chão quando sentado na cadeira durante o jantar. O quão difícil amarrar os tênis, ou segurar da forma certa no lápis durante a lição de casa. O cachorro como cavalo e a vassoura a mais potente espada. Derrotando demônios e monstros por sons de socos e chutes emitidos pela boca.
O dente no chão preso pela linha amarrada na porta recém batida pela irmã mais velha, os pés descalços e a cara lisa. A vontade de ter barba, espinha. “Cadê meus cravos?”.
Vestir o terno do pai, querer sair à rua assim. O gosto ruim da acelga, a surpresa dada pela mãe depois de “rapar o prato”.
O choro doído ao cair. A primeira visão do vermelho vivo rachando de um corte. O medo do escuro, dormir abraçado aos pais. Gato-mia, barra manteiga, lego, playmobil.
Quando ainda assim se é parece tudo ser tão grande. Grande de fora, enorme lá dentro. Coração de criança bate mais forte, fala dos dedos aos mindinhos. Respira essência e vai atrás daquilo que se quer. Sabe-se exatamente o querido.
Aí, talvez, se esconda o grande karma humano. Ver os anos passarem e a cada dia tudo menor ficar. Desapercebe o diferente, aparece o indizível, as ações se repetem, as coisas ficam sem sentido. Nasce a raiva, dá-se um grito e vai dormir de peito retorcido. Como desculpa, o desejo do dia seguinte: ser indiferente. Um pouquinho menor , menor, invisível ... e evaporar.


Lucas G.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Segredo negado

Basta passar a expelir seqüencialmente líquido amarelo,
Que na cabeça estanca a imagem mais negada,
O passado engolido em horas de travesseiro e desculpas.
O inteligível , o retrogrado, o secreto.

Eu transpiro o querer,
Abraço em desejo,
Eu suo das (im)possibilidades.
E disso sempre soube.

Por fim, também sabido é
o caminho já testado.
A retórica perfeita e um fluxo
Por demais jovem.
Não houve impedimento,
E não haveria.
(o primeiro peteleco, pois deslancharia.)
Boa sorte.

Mas aquela conexão há muito deixara a regra
Para tornar-se exceção. E nada podia se fazer.
Assentou, barro duro, asfalto. Enfim.
Ainda desacreditava do amor e, hoje, já não mais escreveria sobre isso.

Havia se cansado de palavras não entendidas,
Resgatadas como pente acariciando cabelo de ego
Em frente ao espelho.
Enfadonho ser assim,
O que foi , nunca mais.
Sobra apenas olhos abertos e o corte certo em oníricas possibilidades.
Em alguma.
Nenhuma.
Sem... qualquer.
Barro asfalto,
Assento duro.
E fim.
Assim eu entenderia.
(Secreto) .

Lucas G.

domingo, 6 de setembro de 2009

Tudo de novo / Roseli Martins

"Se eu tirar você do poço
Se eu falar a sua língua
Você vai sair do limbo
Vai ganhar prêmio no bingo
Vai gritar feito maluco
Vai perder tudo no jogo
Você vai saber que tudo que era muito
Vale pouco

E com o rabo entre as pernas
Com as lágrimas caindo
Vai pedir
Arrego
Vai pedir
Socorro
Implorar
Implore que eu faço tudo de novo"

Gentileza / Marisa Monte



"Apagaram tudo

Pintaram tudo de cinza

A palavra no muro

Ficou coberta de tinta


Apagaram tudo

Pintaram tudo de cinza

Só ficou no muro

Tristeza e tinta fresca


Nós que passamos apressados

Pelas ruas da cidade

Merecemos ler as letras

E as palavras de Gentileza


Por isso eu pergunto

À você no mundo

Se é mais inteligente

O livro ou a sabedoria


O mundo é uma escola

A vida é o circo

Amor palavra que liberta

Já dizia o Profeta"

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Alto mar


Não foi pedir,
A sem jornada,
em três ventos.
Disparada.

Fechou os olhos,
Molhado cabelo,
Já sem medo
ao mar confuso.

Do bote pequeno
Junto ia saudade
Dos aqueles.
Fotografia enlaça aquarela.
E a lágrima caía,
Nem se via.
Gota encarcerada
- chamada do mar.

De longe, avistou estórias.
De lá, recomeços.
Mais uma vez,
Olhos fechados.
E música de horizonte,
Desejo candente e nunca mais
Pra trás olhou.
Fugiu no azul de mar confuso,
Com uma folha amassada no bolso,
Lembrança do tempo de terra que habitou.

Segredo guardado por sol e
Linha fina de mar.
Poucos sabem,
Fincou-se em peixes,
Sombras e estrelas.
E nunca mais voltou.


Lucas G.

domingo, 30 de agosto de 2009

O bilhete debaixo da porta: tapa de vida

E em truculência, eram cantos feitos a toda parte. Reclamantes, arbitrários e indecentes nas vozes dos pequenos meninos. Que deixavam de chorar e preferiam fechar-se ao mundo – que ainda mal os mostrava o tanto aquilo.
Engasgados por tamanha acidez, vociferando, algumas vezes, verborragias por eles não entendidas. Repetidas em inocente senso comum. Mas diziam. Um contentamento tão frágil, por vezes tido como irreal. Pois como se pode em pequena cabeça menina?
E dali culminam as mais tristes anomalias. Contrários inóspitos, porém aceitos em forma de acalento no já vago pensamento juvenil. Depressivos, bipolares, críticos, ríspidos, sintomáticos humanos. Rochas.
Não obstante, o ciclo não se faz linear. Uma hora, aquele interno se cansa, a vida solapa a face, ou deixa debaixo da porta bilhetinho de cor violeta. Muitos sem coragem não abrem. Alguns arriscam e tiram daquela mensagem o sorriso diário, a covinha, um adendo. Muitos desaprendem a julgar. Outros não a entendem .
O bilhetinho de cor violeta carregava consigo as seguintes letras: AVIV e à mim foi entregue por menina de sorriso choroso , e choro sorriso. Ao pé do ouvido contou-me um segredo: Espelho.
Não somente o bilhetinho. Não apenas o bilhetinho e o espelho. Mas a menina. Os seus olhos. A saudade. O tapa da vida.
Aos pequenos meninos sintomáticos, a crença de que meu “viva” apareça de alguma forma. De que se permita as paixões, as caídas, os descasos e acasos. Dessa oportunidade tão frágil e singela. Dessa tão criticada. Menosprezada. Calada. O pensar de que para os meninos um bilhetinho ainda seja entregue.

Lucas G.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Dúbio pensar


Gostinho de café logo que se acorda. Cheirinho de lavanda ao abrir porta de lavabo. Roupa passada ao aroma de sabão de coco. Uma flor pela primeira vez notada. Voz bonita sem saber o dono. Barulhinho daquele primeiro movimento quando olhos se abrem. Um carinho de maneira secreta. Um beijo lento, tônico aos lábios.
Uma ligação inesperada, uma carta endereçada ao seu nome. Um abraço de saudade. Lágrimas sinceras. Um dia triste. Outro feliz. A alegria ao ver o mar. Não esperar e obter. Arrepio de água-fria-cachoeira. Edredom no inverno, temperatura perfeita. Ventilador no verão, acariciando pêlos. Comer quando fome se tem. Um filme de final confuso seguido da roda de cerveja e discussão. Epifania. Alguém querendo sorrir, outro fazendo você sorrir. Perdoar ou ser perdoado. Arrepender-se.
Das palavras, memórias se tiram. Passado e associações. Sinestesias enfurnadas dentro de um pensar humano. Enfadonho incansável.
Estranho foi aquela menina ter me perguntado, naquele exato dia, como era o gosto de paixão. Repeli, no primeiro momento – piegas. Em casa, pensei. Retorci as inúmeras analogias, vomitei em silêncio: “ Eu nunca uma podia ter vivido. Não haviam me deixado? Eu as vetei?”.
Sem respostas. Um telefone mudo, ou talvez, ocupado. Uma carta de via única. Um abraço gelado. Um beijo de lábios cerrados. Um não poder. Desculpas. Inverdades invenções. Off line. Outros momentos. Tristeza. Diária, diário e sentinela. Pés no chão, mãos de ferro. Pílulas. Pornografia. Punheta. Aspirações. Desejos – oníricos. Terreno aliciado, saída precisa. O vermelho , logo ali, corrida. Suor. Olho no olho e só. Passou.

Amargo. Era o gosto. Dia seguinte, não a encontrei para dar a resposta.


Lucas G.

Primavera / Zé Miguel Wisnik

"A primavera é quando ninguém mais espera,
A primavera é quando não,
a primavera é quando do escuro da terra
acende a música da paixão

A primavera é quando ninguém mais espera
e desespera tudo em flor.
A primavera é quando ninguém acredita
e ressucita por amor"

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

O que por você faria

Queria o tanto poder te dizer,
Mas não sou permitido.
A noite, a lua sai, e pela janela imagino.
Imagino o que só, fique aí, pensando.
Pensando o que também só deu-se construindo.

Eu tentei segurar,
Mas pensamentos vão e vem.
Acaba, no final, por uns se acreditando,
Coisa de guri adulto.

Podia e queria, recorte tênue,
Barreira inexata. Brincadeira sem regra e
Um perdedor.

Aceito , lá, os caminhos de uma vida
Iniciada de safanão.
De um jogo ansiado de final, mas de última página faltante.
Aceito, ainda, os possíveis efeitos de uma escolha,
Do dado oco rolando na grama molhada.
Aceito lágrimas como abraços e
Abatimento como diário.
Sorvo em notinhas as angústias,
Finjo elas não existirem,
Ator sem platéia, se lembra?
Paulistano sem causa.

Deixo de ser, faço silêncio, dou um abraço.
Te beijo.
Não deixo vestígio, limpo a coberta, apago meu nome.
Destruo caminhos, refaço desenhos,
Poetando.

Quem sabe cicatriz pequena,
Um corte de faca.
Quem sabe tatuagem de marca pra sempre.
Talvez, a lembrança de um conto bonito.
Queria o todo ter dito,
Mas não posso, gostar de você não me é permitido.

Lucas G.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Estranho viver em terra de garoa

Megalomaníaca cidade de algozes. Marginais despercebidos em meio a frenesi e promoções em portas de vidro. Vidros que refletem desiguais, que engordam, emagrecem. Superfícies que reluzem em preto, roxo e amarelo – as cores novas do verão.
Vidros de nenhum interior. O interno e vago consumo humano. Suprindo malefícios eclodidos da própria cidade. Dos ratos, de barulhos, de cinzas, de estampidos revezados das formas altas às chinelas carcomidas dos também passantes. Os meninos na correria do pega-pega, rolando entre asfalto , poeira e desaprovações. Mas ainda eles ali brincam.
Nessa babilônia de nome tão santo, até o céu se cansa. Enegrecido, propaga-se em nuvens esparsas e azul quase cinza. Estafado está e, quando tonto de tamanho ritmo, vomita em gotas grossas água. Água e ácido. Nessa terra só assim se limpa os vestígios dos soltadores de fumaça, só assim lixo desaparece, só assim a frenesi diminui e os tidos como loucos podem sair à rua e dançar. Ácido caindo na terra, terra dos tantos e de tão poucos. Poucos que nem nome ganham, indigentes de terra natal. Viver brasileiro é questão de sorte.

Lucas G.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Hipocrisia gustativa

- Não sei dizer!
- Então nada diz?
- Nada tenho para lhe contar.
-Pois nada tens?
- E por não ter, as formas se perderam!
-Foram para onde?
- Não foram . Remanescentes , permanecem no incomum . No indizível.
- Não diz por nada ter a contar ou pelas formas terem lá desaparecido?
- Por ambos. Não digo, pois engasgo tamanho não dizer. Aquele nó de pedra. Não sai. Disforme ou emoldurado, entendes?
- À mim, acho que há muito o repeliu e hoje dormes bens , querido!
- Pois agora sabes de meus sonhos? Sabes de tudo o que somente a mim guardo. Peso dos grandes. Guimarães já dizia: “Viver é um negócio perigoso”.
- Pois como! Tens a dizer, mas se esqueceu. Caras e bocas exalam vontades? Diga-me , segredo de Estado. Eu lhe prometo...
- Coitado, tornou-se trivial. Pensa apenas de um lado. Sou ouriço criado, dos grandes, e das puas minha defesa faço. Diariamente, desacredito no verossímil. Num explícito indesejado.
- E não mudas? Tirou,alguma vez, o recheio de um biscoito? Inverteu a ordem? Sentiu medo?
- Sou ego. Quero carícias e confortos. Fragilizado propago nesse caminho que, ao menos uma vez, deu certo. E como... Não são pedras, formas ou vontades. Carinho. É simples. Deixei há muito de sentir, desacredito em tão vaga possibilidade humana. Acalento encontrei somente naquilo do passado. Na nostalgia...imutável!
- Sensação boa a ti !
- Somente, mas quando se sente egoísta se torna. Fui tudo e mais um pouco. Mas, querido, as puas não deixaram de existir. Não imagine, pois nada acontece. Continuo o de sempre, o obsoleto, porém silenciado, entorpecido por defesas que eu próprio desconheço.
- Se desconhece e se defende. Vês fim em tamanha artimanha?
- Cá, hoje, sou. E sendo, propago. Em veias, em memórias e ritos. Nunca serei um, sou aquele que a situação me permite. Faço do vigente minha maior essência. Sou tantos dentro de um.
- Pois, agora, cá eu entendo. Desmistificar. Simples assim. Achei ter visto um dentre tantos. Engano, soslaio, “chiste”.
- Lição arraigou-se uma. Não minto e quando não sei omito. Fico no silêncio, letal arma humana.
- Letal e desconhecida. Muito aprendi contigo.
- Feliz eu fico. Só aprendo quando vejo mudanças. Você deu-me idéia de sentir. Não obstante, sei que nada mudei. Disfarço, meu caro! Sou bom nas artes de corpo.
- Bonito ouvir sua voz cuspir tais palavras.
- Já não posso mais mentir. Não à ti.
- Pois cuspa, meu acalento tornou-se isso ouvir.
- Cuspo!

Deitaram e fizeram amor até o sol amanhecer. O sol, diferente, dos tantos outros. E não tinham nada mais para explicar. Ficou apenas aquele silêncio, por eles, tão bem apreciado.

Lucas G.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Só assim (ou por muito pedir)

Queria provocar, mas ter suas respostas.
Estímulos diários, mas não somente unilaterais.
Havia se acostumado aos tantos.

Queria o novo, o surpreendente.
Por outro, sonhava em saber aonde pisava,
Conhecer todas as curvas, cada meandro. Trejeitos.

Ela queria ouvir coisas. O tempo todo.
Queria o fim dos sonhos. Apagar tão insoso limiar.
Sentir o prazer despreparado, mas a gastura de saber que este viria.
O fim entre etéreo e terreno.

Acalmar-se frente o outro, pois conhecia os passos.
Delimitaria assim, perfeitamente, as raivas. Os traumas.
Ela ansiava mudanças. Sentiria o sabor de orgulho delas.
Mudanças sem vetores,
Desproporcionais e
Tão deles.

Mudanças difíceis, porém palatáveis.
Entendeu-se e agora ela realmente deitaria. Dormiria.
Os recortes do passado acabariam, pois tinha um segredo.
Um segredo que alguns trespassavam vidas e nada encontravam.

Quando pudesse tudo isso sentir. Só assim, descobriria que, entre muitos.
Entre todos. Ela conseguira.
Fecharia os olhos e com sossego, sentiria uma chave lá no fundo do bolso.
Chave dada por ele, outra troca justa. A mais, talvez.

Teria esse jogo seu fim. Pois ambos com suas chaves teriam o código de abertura da caixinha.
Caixinha apelidada por eles de “recíproca” -
Nome que gostavam de pronunciar.

Daí então, dormiriam e sonhariam com a vida que tinham,
Um reflexo exato de tudo que já possuíam.

Lucas G.

Culpa de Francisco



Por que a marola do barquinho de pesca que passava.

Por que o dourado, cor de semi-árido.

Por que os peixinhos na borda, curvas e ritmo. Poesia viva.

Por que pés chafurdados na areia, fazendo cosquinhas. Carinho de rio.

Por que o pouso do alado da região em frente a barriguda. Pose para a foto.


Esse águão não era qualquer um que olhava.

Era beleza para aprender a ser vista.

Água de nome santo,

rio das tantas cores, mas de um só coração.


Rio dos amantes, dos pescadores, das estórias.

Rio amado, Rio cerrado. Rio Francisco.

Meu ser tão São Francisco.


Lucas G.


sábado, 1 de agosto de 2009

Segredo de céu



O pipa cortando azul.
Cor de livro, canções de ninar. Azuis.
Só céu, só cor.

Degradê daquele mais clarinho perto do horizonte, sabe?
Até o maduro, céu crescido, com frutos.
Frutos de algodão. E o pipa se escondendo.

Penduricalhos tecidos pelas mãos da mais velha bordadeira,
De uma cidade do norte das Gerais.
E ninguém sabe. Não podem saber.

Ela tece céu em forma de penduricalhos.
Ela guia o pipa. Ela venta em azul – se vê!
Nos algodões, modela. Para os pequenos,
Os pequenos aprendizes da pipa.

O pipa e o vento,
O vento e as formas.
Formas de fábula, frutos maduros de céu crescido.

Arte bordado. Penduricalhos e antigos segredos.
Muito além de céu, nuvens e ventos.
Mas ninguém sabe.


Lucas G.


Carlos, menino de rio. Doce, a água que dança nos dedos de um pé moreno, de um equilibrar inato nas pedras daquele águão que caía. Não era chuva. Era doce, como Carlos. Água doce. Desce céu, vira morro, cai em forma de menino, nos dedos e das pedras.
A macambira nas mãos de sol. Um cumprimento apertado, talvez, o bater simultâneo de corações doentios. Um abraço. A macambira e as mãos molhadas. Um refresco, troca justa, a pura fotossíntese humana.
Mãos de macambira envoltas em água, em corpos. Natural orgasmo fagocitando sinestesias. Carlos e a flor. A flor e as mãos. Nativa. E bela. E única – na frieza dos homens dos altos saltos.
Obsoleta, trivial. Às vezes, simplista nas mãos de Carlos. No som da água que caía. E não era chuva. Apenas a voz que cada pedrinha cuspia. O som que apenas Carlos dizia. Som de vento. De água. Voz de flor.


Lucas G.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Passado vivo, estória de morro

A casa do toque da mulher. O toque a cada canto. O canto e uma estória. Um enredo de tantos cantos. Dos finais incertos. Um tecido; uma miscelânea regada a café com leite e queijo meio cura.
Lá, era o amor exalando dos tecidos. De móveis pensados, da vista do morro - Alto, grande e deles. A casa- memória pulsava em lágrimas discretas da senhora sentada no banco de madeira no fundo da praça. A senhora esquecida engolfada nas memórias da mulher querida. Da mulher de um só toque. Toque que as palavras não descreviam. De lágrimas que caíam.
Passado. E lágrima vivida. Era sentimento da nascente. Uma dor de dentro do peito. Dor funda. Saudade do que já não se tinha.
Hoje, ela acoberta o morro, esteia sol. Contadora de estórias protege o cerrado e vive em cada ladrinho daquele lugar entre Corinto e Curvelo.

Lucas G.

Sertão de coração menino


Alexandre: palavras de gente crescida num corpo de menino sertão. As mãos de terra, pés de homem feito e coração de chita.

Sobe na árvore de grossa casca como trepadeira naquela casa antiga, como voçoroca rasgando o cume do morro. Em fragmentos, em pedrinhas de cores e texturas - Quartzo, ardósia, ouro.
Boca cheia. Menino de sabor sedento, de palavras transviadas, de hiatos precisos e, no geral, fala constante. Fala de ritmos mineiros. Palavra cantada – do pequeno à anciã. Assim era Minas. Assim era o menino. Um grude conciso pela dissociação. Nós, das peles cuidadas e das tantas alergias. Eles, das sandálias, do forró e dos pés de terra. Unidos num tempo de dois dias, um lusco fusco e o cuspir do cerrado.

Bioma intelecto. Aprendeu a usar o fogo e, agora, o cospe em formato de Sol.


Lucas G.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Contato primeiro

Oito passos de rua, casa pequena, sobrado - gostinho de interior. Primavera, de cor da laranja, de roxo, de rosa. Planta e flor. Mistura o toque de mulher, a primavera e o pequeno alado beijando as pétalas.
Ao fundo, batidas. Batidas e o morro. O morro ao fundo e o som – personagem principal. Sol na cabeça, limpa uma gotinha de suor que cai até a ponta do nariz. A batida, agora, ao fundo e o morro em frente. Apenas e só.
Batida enorme nas mãos dos pequenos. Som dos pequenos em terra de morro grande. Sincrônica, porém erros também surgiam, e deles risadas. Brincadeira de som. Som de criança e bochechas vermelhas. Era vergonha. Seria aquele ritmo segredo? Não sabia. Não soube, apenas dancei. Dancei música de criança. Música dos pequenos em terra de morro grande.

Lucas G.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Sem título

Roia as unhas que já não tinha. Olhava na janela e a sua cara pálida refletia a noite passada. Vodca seguida das batidas de uma balada no subúrbio paulistano.
O relógio de pulso anunciava o amanhecer do dia. A casa ainda em silêncio; alguns fechares de portas e esporádicos estampidos do chão de taco marcavam um novo dia para todos os outros. Mas não para ele. Ele não tinha um novo dia pra começar.
Sentado numa cadeira velha em frente ao computador revezava entre salas de bate papo e profiles do Orkut. A inanição lhe apetecia. Tinha livros para ler, tinha coisas a escrever e, naquele momento, até queria conversar. Porém, tudo era tão difícil, era distante. Aquele homem se deixava levar pelo barulho da máquina, pela restrição das tamanhas possibilidades de uma rede infinita, pela única coisa que ainda lhe dava alguma espécie de prazer.
Homem feito de tecnologia. Por tudo que este fazia dela, uma dose diária do mais puro veneno: a idêntica sequência de ações. Não havia o que começar, pois já não sabia o que era o diferente. O homem temia a distinção.
Junto ao tocar das teclas, via-se sangue. As unhas, quase inexistentes, pediam socorro a mais aquela repetição. A perna mexia num frenético cacoete, movimentos exatos e, por mais angustiante que fosse, iguais. Exatamente iguais como todos os outros dias daquele homem.
O cigarro no mesmo horário, a tontura e o cheiro da nicotina excitavam um falo já automático. Erguido por aquela sequência. Seu orgasmo tinha horário, seu prazer um site.
Ejaculava e de frente ao espelho dava adeus ao seu sexo. Há muito, virtual. Um leve gemido no ápice do seu orgasmo relembrava os antigos momentos reais, as carícias e o cheiro de gente. Fingia se satisfazer, até tentava distinguir as inúmeras masturbações noturnas. Mas até elas, tinham se tornado iguais.
Às sete da manhã, mais um cigarro. O escovar dos dentes seguido de um gole na água da torneira. Desliga o computador, coloca o pijama, deita na cama de bruço e adormece até as três e meia da tarde, quando seu relógio iria despertar e mais um dia reiniciaria. Idêntico e sem começos. O dia das teclas, das gozadas, do sangue. Os dias iguais precedidos de noites de vodca e batidas frenéticas, porém vazias e sóis. Aquele homem não sabia ser diferente.

Lucas G.

domingo, 5 de julho de 2009

Não haveriam explosões



Naquela relação haviam apenas enganos e enganados. Uma junção imperfeita, um processo de coligação altamente fictício e, diria até, de base nostálgica.
De certa forma, aparentava que da relação não existia o palpável, o definível; apenas um abismo, uma clivagem irresponsável dos corações soltos, dos desejos mais primários e infantis, de um começo necessário, mas hipócrita. Como a relação toda em si.
Longe de querer os mesmos questionamentos ou elucidações. Mas todo recomeço é pautado em algum passado. Todo recomeço carrega consigo singelas picadas daquele inseto verde de Clarice. Recomeçar revivia o pedido da última onda do ano que se despedia.
E eu não conseguia. Não queria. E não podia. Um recalque sólido e frígido. Uma atitude que estava longe dos sentimentos e fincada na racionalidade e na frieza do esquecimento.
Ao recomeçar, achei ser apto a tudo o que viria. Achei poder transformar meus exaustivos dogmas, tive certeza que minha visão havia mudado, que meus anseios eram outros e que a jovialidade do antigo discurso já não apetecia. Pois bem, e não mais mesmo.
Muito havia mudado. Outros momentos, outras pessoas, outros ciclos e círculos. Contudo, ao medroso aqui que vos fala, uma antiga sensação passou a ocorrer. O passado rígido, o delimitar abusivo, o esquecimento palatável, estranhamente, arqueavam-se e afrouxavam aquela redoma altamente intransponível.
Mas, sem explicação, no instante da ação tomada, já elucidava: Jamais seria.
Não sou capaz, não me divirto, não são adendos. Quis que fosse, continuarei tentando na hipocrisia anormal, ou talvez, na normal veracidade de passos trêmulos, de ajudas sinceras e descompromissadas. Não obstante, um medo ainda permanece, um medo que, apesar de não admitido, transpassa o limiar do querer. O medo do retorno. O pavor da irrealidade. Um medo de mais feridas e de possíveis explosões. Não consigo, não posso e...

Lucas G.

terça-feira, 30 de junho de 2009

Dito - sem palavras

E assim disse – sem rodeios.
Cravando no silêncio daqueles dois corpos,
Uma negação.
Com silhuetas daquelas palavras já tão afirmadas.
Aquelas do começo.

Os pés chafurdados em terra,
Margeando o limiar de um barranco,
- Minha clivagem mal resolvida,
Uma dança rarefeita,
Dos sem timbres.
Dança rouca e
nua.
Ritmada, mas sem o sabor daqueles sustenidos.

À frente aquela reconfortante porta aberta,
De todos os dias,
A maçaneta com apenas um parafuso,
A madeira, já com farpas,
O barulho conhecido
E a porta nunca fechada.

O humano teme.
O humano chora.
Ele nega, não adentra, muito menos, pula.

Ao barro, fincou-se. De tal forma,
Que o esbofeteio, de certo, seria pior.
E foi...
Veio com a força daquilo mais sonhado,
Com a incredulidade de uma atitude leviana.
Um cuspir gélido na cara daquele que errou em querer acreditar.

Uma porta aberta nas antigas
- Aquela lembrança que não pode sair do retrato;
Um pulo evitado às cegas;
- Seu choro e minha inanição.
Meus desejos, sua completude.
Uma fissura e seu sexo.
Meus orgasmos, seus pudores.

Lucas G.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Apenas um alguém que se utiliza diariamente do veneno que mais teme: as palavras.

domingo, 7 de junho de 2009

Apenas começos


Uma vida de começos, mas longe dos finais. Nunca um final. Conclusões obscuras e salobras, encaradas, aos outros, como um ponto daqueles que se quebra o grafite.
Nem vivido ainda tinha, esperava, não tinha medo do tempo. Aos outros, o peso e a definição em todo o momento. Mas não era os outros e, talvez, fosse isso que o transtornasse.
Suas diferenças, seus anseios, sua forma de olhar, seu olho, sua voz, por que não uma simples analogia? Uma. Apenas uma.
Por muito achou ter encontrado alguém com aquela tonalidade, com sua mesma forma de olhar, de levantar da cama, de estralar seus dedos. Mas era só mais um começo sem final algum.
Em todos esses finais entendidos abruptos pelo menino, o tempo era sacado do bolso e armado como maior desculpa, como refúgio e solução. Não podia dizer, não conseguia uma palavra soletrar nesses instantes. Quieto, desaparecia. Simples, à francesa e só.
Dentro dele, a vontade de ouvir: Errei! Volta. Mas, o próprio menino, ria. Os filmes já não o apeteciam e as novelas eram a melhor forma de devanear. Para os tantos planetas, para um além, para uma história com algum final.
Aquele menino cansara de seus começos e, cada vez mais, menos se entendia. Adaptara-se aquela seqüência de fatos corriqueiros que davam graça a vida. O gosto do inesperado, o arrependimento, as lágrimas e os beijos. Nutriu-se disso, por um bom tempo. Mas o seu final jamais viera. E, hoje, assim permanecia.
Engraçado... desde pequeno era assim. As idéias vinham, mas nunca as finalizou. Sempre faltou aquele traço, a última bolacha, o estrear da peça, o ponto final daquela crônica. O menino era feito de histórias sem finais. Contínuo, perdura nas páginas velhas do livro do avô lido ao redor da fogueira para toda família e junto aos piares que desapareciam no frio das montanhas. Até eles tinham seus términos. Mas não a história daquele velho livro.

Lucas G.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Final moído, estória requentada

Vem, um erro nosso.
Dança e traga aquele maço azul.
Finja um orgasmo e
Corre nas veias alergia ao sólido.

Defina, sem palavras
E atue sem alguém ao seu lado -
Consegue?

Uma vez, já te tocaram?
Tocaram?
E foi daquele jeito?
E foi real?
Sentiu a pele do outro?

Longe permaneça.
Não transpasse a derme,
Tenho medo de doenças em meus poros,
Existo apenas dentro daquele vidro.
E eu não posso,
E eu não quero,
E eu não,
Nunca
Não.

Enlouqueça, pois, de inanição,
Bata palmas ao seu teatro,
Ao seu maior engano.
Arrependimento, não bata,
Aquilo é água e
o que sai do repetido movimento:
Apenas pedra moída.

Apenas pedra moída que saiu de você.

Lucas G.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

throw your arms around me/ Pearl Jam

"I will come to you in the daytime
I will climb to your bed
I will kiss you in four places
As I go swimming around on your rear
I will squeeze the life right out of your
I will make you laugh,
I'll make you cry
And you may never forget it

As I make you call my name as a shouter to the blue, summer sky
And we may never meet again
So shed your skin lets get started
And you will throw your arms around me

I will come to you at nightimeI will climb into your bed
I will kiss you in 155 places
As I go swimming around on your rear
I will squeeze the life right out of yourI will make you laugh,

I'll make you cry
And we may never forget it
As I make you call my name as a shouter to the blue, summer sky
And we may never meet again
So shed your skin lets get started
And you will throw your arms around me"

domingo, 31 de maio de 2009

Doença sem causa ou Retrato de uma mulher doente

E aquela mulher estava doente. Doença sem cura. Não precisava de remédios. Nunca se importou com sapatos novos, não tinha pressão alta e sua família , na medida do possível, sempre teve tudo ao seu alcance.
Aquela mulher não queria viagens, pois as tinha. Não mais como as do passado, mas se contentava com idas á hotéis fazendas e as lembranças dos momentos vividos em Paris eram suficientemente reconfortantes.
Fato era que aquele incômodo não podia ser simplificado. Estava longe de depressão, síndrome do pânico ou histeria. Já tivera úlceras, sarampo e catapora. Sua doença, agora, era incompleta. Era indefinível. E quase sem sintomas.

A mulher era independente, já tivera o prazer da maternidade, tinha até plantado uma árvore. O livro não havia escrito ainda, pois achava sua vida desinteressante e a falta de tempo inibia a realização de páginas concretas. Às vezes, pensava em alguns capítulos, mas nada muito sólido.
Solidez tinha apenas em saber que estava doente.
Aos outros, caracterizava-a como a doença do espelho. Tinha medo de ser a primeira, acalmava-se junto aos goles de uma vodca bem gelada, onde apenas nesses instantes, enxergava o incomodo como obsoleto. E esquecia.

Porém, bastava deitar na cama. Era necessário apenas um ronco de seu marido ou uma resposta atravessada de seu filho para que o coração saltasse e ela tivesse certeza que doente permanecia.
Nesses momentos, corria ao banheiro e acendia um cigarro guardado as sete chaves na ultima gaveta do armário perto da privada. Sentava e fumava. Fumava e esvaia. Com medo, olhava no espelho apoiando as mãos na pia e sentindo o mármore gelado. Olhava fundo e da fina camada de vidro nada via.

Se via mulher, mulher já nos seus cinqüenta anos. Realizada, ativa e vivida. Concentrava-se até a veia saltar na testa. Para aquela mulher, um reflexo inexistia. Todas as noites eram iguais. Uma trepada, já não tão gostosa. Um abraço, já sem tanto carinho. Uma conversa, de poucas palavras.O silenciar de seus filhos. O preparo da janta e a marmita na geladeira. Ela era uma intrusa dentro de sua própria casa e nunca se absteve de nada. Buscou saber, quis conversar, tentou melhorar.
Aquela mulher já não se sentia. Era como a fumaça de seu cigarro noturno.Insólita, volátil e efêmera, fez de tudo para ver um erro seu, algum estopim causador da situação em que vivia. Mas nada. Absolutamente nada. Não houveram erros ou falhas.

Sua doença não estava na cabeça e seu corpo invejava meninas de trinta. Porém, ela era meia. Há muito não experimentava de extremos, tinha esquecido a ultima vez que se sentiu completa. Aquela mulher não tinha reflexo, pois vivia uma vida intrusa, vasculhando nas lembranças do passado razões para o presente, ou possíveis acertos nostálgicos aplicáveis na sua rotina doente.

Aquela mulher estava de cama. De uma doença sem causa. E sem causas, vivia. Nos cigarros e nas mãos trêmulas, em intimidades e retrocessos, em incômodos e culpas. De carne, osso e veia na testa, mas longe do reflexo e de uma possível completude.Sabia apenas que amanhã, entre fumaças e goles de vodca, uma outra lágrima escorreria.

Lucas G.

sábado, 30 de maio de 2009

Lapidado de um livro

As mãos não queriam parágrafos,
Estavam prontas para grandes sentenças.
Queriam um carinho,
Cansaram dos parênteses,
Não respeitavam a força das crases.

Aqueles dois corpos
Nem a gramática mais seguiam,
Transitavam intransitivos na
Esfera subordinada das regras dos porquês.

O sentido sumiu conforme as perguntas,
Suaram na definição de local,
Adjetivaram o tempo,
Simplificaram si mesmos,
Engolfaram tantas vírgulas,
Silenciaram o sabor daquela frase de efeito.

Porém se amavam, mas
Segredos assim jaziam
Em sonhos de cobertores enrolados,
Longe tinham de permanecer da semântica,
Arraigando-se nos devaneios de longas reticências e no
Frio e relativo espaço das entrelinhas.

Corpos em chamas e a inexistente não percepção.
Corpos,resguardados dentro de portas distintas?
Quem sabe, corpos afogados na memorável nostalgia?
Corpos que nunca juntos permaneceram,
Mas longe pouco estavam -
O maior adendo na cabeça do jovem menino.
O saudosismo de seu primeiro vazio,
O vazar da primeira saudade,
Nas lágrimas ,
Nas palavras de uma gramática normativa,
Que desistira das normas nessa estória e
Aceitou tudo sempre virar música,
Canto esbaforido,
Um sussurro misturado com um calafrio
de uma gostosa melodia de amor.

Lucas G.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Questiona o profissional do riso


O ator das sete faces,
resíduo humano
fagocitando partículas,
resquícios,
mercúrio.

Daquela última máscara
o encaixe imperfeito.
Surpresa marginal,
sussurando no rodar dos ponteiros:
Astonishment,
astonished.


Todos os outros mimetismos do ator:
pertinentes , exatos, quem sabe até, milimétricos.
Linhas traçadas,
matéria pintando a cara,
borrão de tinta intelígivel ao profissional do riso.


Mas não aquela última,
um entendimento todo errado,
do avesso,
fictício,
rasurado
- Amassa,
amassa...


A última máscara transfigurava-se naquilo tudo que eu mais fugia,
naquilo tudo que você temia,
e o ator queria dizer,
ele queria.

Mas da solidez daquela última máscara fria,
não houve estilete que sangrasse uma boca sadia,
palavras - múrmurios e
instintos calados.

Em silêncio, o ator e sua proteção fingida transitam em tênues limiares,
dos tantos: Não saber
e se enganar ou
ter ciência,
porém optar pela ignorância intransitiva.


Até que ponto vale a sinceridade a este ator sem o dom da fala?




Lucas G.

domingo, 17 de maio de 2009

Prometo

O escuro círculo do peito,
Uma bússola invertida em contrários cotidianos.
O costume , pois sim, existe.
A indiferença, arma pesada ou
Aquela cara fechada entre esguias sobrancelhas
- Fatídico saudosismo.

Gritar alto,
Chorar sozinho,
Viagem longa,
Tarefa árdua, pois o tempo não pára.
Não pára.
E juro que já tentei.

Esvaeceu tudo aquilo que um dia te disse,
Derreteu toda a solidez dos antigos anéis,
Não existem mais pensamentos e clivagens deixaram o meio do peito.
Te juro .

Mas o círculo escuro enraizou em veias, artérias e vasos.
Há tempo não via as cores mudarem,
Por muito , achei ter aquela injeção feito seu efeito.
Mas , hoje, não.
Não hoje.

Não pensando, pensei.
Esquecendo, lembrei.
Desistindo, busquei.
Hoje, não haviam escolhas e
Meus sorrisos não saiam,
Mas tentei.
Tentarei.
Te juro.

Mas não hoje,
só hoje.

Lucas G.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Trecho final música Ai/ Paisagem Humana/ Rubi



"Eu te amo - disse.

E o mundo despencou-lhe nas costas,

Não havia de sofrer tanto.

O mundo pesa sobre o amor,

Leveza dá pena no espaço,

e se teu amor por mais pedra não voar,

liberta tuas costas do peso que não carregas.

Se teu amor por mais pena não mergulhar,

vai-te banhar e olha-te no olhar que não te cega.

Se teu amor te pesa,

mais que o mundo que carregas,

degela-o e deixa-o beber os deltas"