segunda-feira, 28 de junho de 2010

Sem título

E perceber que meus verbos já não dizem o que quero,
mas o que guardo. O que tanto guardei.
E que, hoje, não há sentido.
O regalo de alma, o rubro poço e a praia da Divisa,
memórias lindas de um tempo criado.
O real é infrutífero,
raso e vago.
Não foi,
e , por fim, tenho o certo:
não cuspo a vontade,
apenas gorfo aquilo, uma vez, não tido.

Lucas G.

sábado, 26 de junho de 2010

Redenção

Engoles ácidos,
suas palavras usadas para outrem.
Azeda inanição,
sua obra trasmutada em cópia perfeita. Sua.
Sulfúrica,
a culpa.
Corrói laços só teus,
recria, disserta e
se insere em uma narrativa
já assinada.
Encontra espaço em um texto tão próprio
e dissolve significados de tão grande importância.

Lucas G.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Paulatino

Passado criado
alojando alma morta.
De cuca doída,
se pensava,
achava,
e eram tecidas as melhores obras.

Linearidade,
esmiuçada pela extravagância
e gestos forçados a convencer.
De não começos,
criou-se enfins.
Pois então, se virou.

Para muitos, apenas mais uma vez,
para ele, o cansaço de um dia de trabalho intenso.
Era seguro a não mudança,
o pensar demasiado em mentiras refazia,
e cansado do contrário, recriava o intangível.

Mas dessa vez havia de ser diferente,
sem cheiro,
sem cor,
sem olhos.
Virou espaço,
eco rugindo no fim da sala,
atrás da cabeça,
em sonhos coadjuvantes.

E ele nunca tinha agradecido tanto pela mudança feita,
se não pronta,
a delícia em pronunciar: VAGAROSA - tente!
Era real e ele estava conseguindo.

Pela primeira vez sentia o cansaço do que já tinha sido e entendia o imutável


Lucas G.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Terapia

Eu caí.
Ainda não sei aonde sangra, mas a perna lateja e repuxa. Não nessa ordem.
Eu caí acreditando que vodcas e energéticos poderiam falar por mim. Fazer por mim. Que aquele álcool ao transpassar venosas, não me faria responsável por nada ou ,pelo menos, não sentiria o peso nos ombros, ou melhor, as dores nas pernas. Não sabia envelhecer. Não queria ter nome completo, trabalhar todos os dias ou ser pai de família. Não estava certo de meus gostos e nem das escolhas que , um dia, tinha feito. Pensar nas que eu faria então, era tremedeira na certa. E aquelas doses, por muito, me salvaram de qualquer limite, enclave ou solapada da vida.
Eu me fazia distante de tudo e só me sentia vivo naquele bar, na sexta feira e quando não precisaria acordar cedo no dia seguinte.
E numa dessas noites, o tombo foi feio e eu sangrei. Nunca tinha visto uma cor minha. Era vermelho e escorria de meu corpo. Foi a primeira vez que me senti incapaz. A perna tremia , o corpo doía e meu reflexo no espelho era amargo. Eu estava doente. Uma doença de não sintomas, sem motivos e que veio destruindo a fragilidade de minhas noites de baladas, dos porres coletivos e de sexos casuais.
Dia após dia, ela arranhava as antigas feridas, denegria meus dogmas e expunha a dor mais aguda. Uma dor que sempre escondi: a dúvida.
Galguei minha vida na efemeridade, na ingenuidade de uma criança travestida pelas poses de menino maduro.
Minhas pernas doem, pois não quero ser em minha própria vida, prefiro o estado espúrio das noites de gandaia. De não pensar em dias seguintes, em caçar as migalhas de instantes. De segundos de prazer copiados de sites de pornografia virtual.

Ainda tenho medo de crescer e meu grafite já não quebra em pontos finais.


Lucas G.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Em não memórias

Desse rosário, fui em sem destinos,
da forma mais densa, do canto mais fino, de líquido inato.
Cuspi palavras e existia. Tinha cor e eu queria.

E veio o um dia.
Conheci a noite,
fiquei sozinho
e sua voz secou.

Nada me espanta
se, por fim,acabo esquecido.
Talvez, sempre sido,
sendo,
em curtas palavras,
em frases vazias,
em não sons,
desfaço-me.

De uma promessa não cumprida,
de um soslaio,
de um vulto,
de sombra roubando cor e
querendo virar quadro.
Não fui.
Não sou.

Distante foi opção,
não houve contra fluxos,
rebeldias ou discordâncias.
Argumentos da compreensão,
acenando a cabeça -
retórica sofista.
Gumes que vermelho acenaram,
patuás escondidos por trato feito -
fatídico conceito esse de verdade.

Não aplique surpresa a um novo tão conhecido ,
as mudanças não se fazem frias,
não se sente aquilo
que nunca houve.
E se acabo vazio,
se o desenho se faz de recortes,
da areia,
se , hoje, se coloca como criador
e se sofre ou escreve textos,
seria eu apenas fagulha?
Permaneço vulto?
Criei mesmo essa estória, como havia dito?

Perguntas no sem tempo,
inúmeras, mas caladas.
sem cor, sem nexo, deixadas em antigos poemas amarelos.
Estado amorfo, caderno vazio.
Chorei esse diferente.

Acabo ainda como pergunta:
E se o arrepio deixou a espinha,
foi o vento que deixou de bater
ou foi a janela que sempre esteve fechada?

Lucas G.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Pequeno flat

Então, você entrou. Deixou as chaves naquele mesmo lugar. Estralou as costas, dizia estar cansado das horas de trabalho. Foi até a geladeira, pegou uma cerveja da marca que mais gostava e a abriu com os dentes. Deu um primeiro gole e disse estar estranha. Seriam todas ou você não gostava da bebida? Nunca perguntei.
Foi até minha cama e procurou por mim. Gritei do banheiro que terminava o banho.
Tirou suas calças, abriu a gaveta esquerda do criado mudo e passou o resto de perfume que ,um dia, disse que gostava. Se olhou no espelho, ajeitou os cabelos e viu que o bigode já dava os primeiros sinais de gilete. Não ligou.
Entrou no banheiro.Eu não ouvi.Apagou as luzes e de dentro do box eu gritava verborragias ao velho síndico e aos problemas elétricos do pequeno flat.

Silêncio...
Uma mão e estava erguido.
Quente, o cheiro do cabelo no momento em que a água começava a cair.
Era doce e vagarosa. Preenchia cada ranhura.
Em passos , nas bocas.
Duas bocas, o não movimento de corpos amantes.
Nossos.
Seu instante e minha alma esvaindo-se pelo ralo. Água de dentro e resto de cama.
Dois brincando de um só.
Num beijo, no falo, da noite.
Vieram também promessas e você abriu minha mochila e pegou o shorts que gostava de dormir. Eu aceitei.
E sonhei.

Na manhã seguinte, deixou em cima da mesa da sala, um bilhete. Já não voltaria. Dizia que a gira do mundo segue e que outros cantos davam viço a uma alma envelhecida. Se utilizou de sóis, luas e nossos poemas como possíveis explicações. Fechou a porta e arrastou a chave para debaixo da porta. Saiu. Eu não ouvi.

Uma última noite ou objetos estrategicamente alocados?
Eu nunca mais te vi.

Lucas G.